terça-feira, 12 de julho de 2011

Alfaiataria Real (I)


  Começo com este post a partilhar alguns autores e poemas dos quais gosto. 
 Quanto à escolha dos poemas, esta prende-se com o meu gosto particular e com uma tentativa de evitar os mais conhecidos dos autores que partilharei. No caso do Fernando Pessoa ortónimo, muitos outros e mais conhecidos haveria do que este, como o "Mostrengo", entre outros.
 Quanto à análise, esta não pretende ser completa e exaustiva, mas uma explicação do porquê de gostar do poema.
Fernando Pessoa 

Quinto Império


Triste de quem vive em casa,
Contente com o seu lar,
Sem que um sonho, no erguer de asa,
Faça até mais rubra a brasa
Da lareira a abandonar!


Triste de quem é feliz!
Vive porque a vida dura.
Nada na alma lhe diz
Mais que a lição da raiz-
Ter por vida a sepultura.


Eras sobre eras se somem
No tempo que em eras vem.
Ser descontente é ser homem.
Que as forças cegas se domem
Pela visão que a alma tem!


E assim, passados os quatro
Tempos do ser que sonhou,
A terra será theatro
Do dia claro, que no atro
Da erma noite começou.


Grecia, Roma, Cristandade,
Europa- os quatro se vão
Para onde vae toda edade.
Quem vem viver a verdade
Que morreu Dom Sebastião?


   O poema "Quinto Império" tem vários aspectos interessantes e passíveis de análise. Prender-me-ei com apenas alguns. 
   Em primeiro lugar, não se trata de um mero exercício decorativo e de poetizar por poetizar. Na minha humilde opinião, o poema vale tanto pela beleza da sua sonoridade, como pela consistência da sua mensagem. Há uma mensagem clara no texto:
São tristes os que vivem conformados. "Triste de quem é feliz". Ser homem equivale a ser descontente, pelo que os anteriormente referidos não serão homens na sua completude. Deste ponto, o autor parte para a afirmação de que o povo português deve aplicar essa ambição e esse descontentamento na formação de um Quinto Império. O facto de ser o quinto reside na crença do autor de que as pólis gregas, o império romano, a "cristandade" (?) e a "europa" teriam sido os anteriores quatro. Isto apenas para dizer que o autor difere daquele que primeiramente concebeu a ideia do Quinto Império, o Padre António Vieira. De tudo isto, o autor exprime uma mensagem, um apelo, um raciocínio palpável, não uma mera conugação de palavras que soam bem juntas.
   Além disto, a sonoridade é bela. Basta declamá-lo uma vez com calma para o perceber. 
   Finalmente, há uma coisa bastante singela que simplesmente adoro neste texto. O título não é uma proclamação do óbvio. O título tem uma função. O título explica o poema, e este estaria incompleto sem ele. Não que todos os título tenham de ser uma chave de compreensão dos poemas. Mas o facto de o ser é algo que embeleza a obra. 
Assim, sendo uma obra com uma mensagem consistente, expressa de maneira agradável ao leitor, este é um belo poema, do qual eu gosto bastante.

1 comentário:

Anónimo disse...

Conciso e completo como dizia o prof Carlos Marques! Muito bem! Fico à espera de mais alguns ;)
António